REFLEXOS DA ÉTICA MAÇÔNICA


Sinopse: Objetivo da ética maçonicamente orientada.

O Rito Escocês Antigo e Aceito tem rica filosofia da qual o maçom dispõe para sua autoconstrução. Este cabedal filosófico reflete-se na sociedade na forma de mudanças que promovem libertação do sistema humano que subjuga o pensamento das pessoas. E todas as mudanças sociais e políticas ocorrem antes na mente e depois se materializam na forma de ações e produtos em constante evolução e graus de complexidade.

A transformação é obtida aos saltos pelos que trabalham os neurônios constantemente. Abruptamente, despertam, fixam-se e mudam conceitos, verdades.

Ao longo da história humana os saltos intuitivos sempre foram influenciados por fatores ambientais, genéticos e culturais. O software da mente gravado no hardware do cérebro humano só progride em resultado da troca de informações entre indivíduos em debates, conversas ou leituras.

O método maçônico visa estes saltos intuitivos de seus adeptos para encontrar a solução de problemas que se refletem na sobrevivência pacífica da espécie humana.

O homem sempre usou dos pensamentos de seus semelhantes para desenvolver máquinas, escrita, arte, ciência e toda a cultura existente. O maçom usa seus companheiros para deles extrair e desenvolver pensamentos que mudem sua forma de pensar e agir no campo moral.

Da camaradagem desenvolvida nas reuniões brota a força que muda intelecto, emoção e espiritualidade. É a energia condicionadora que o grupo social exerce sobre o indivíduo.

E isto é realidade desde a época das cavernas, onde um ser humano influiu na educação do outro, até acumular no presente toda a vasta cultura política, metafísica, social e tecnológica. O maçom é multiplicador da filosofia político-social da Maçonaria.

Do conjunto de atividades do filosofar maçônico ele desenvolve posturas que constituem o código de ética que dirige seus passos e que se reflete no meio social.

E como ética e moral se confundem, pois é tênue a sua diferença e profundo o seu alcance, convém esclarecer o que é a ética maçonicamente orientada.

Na conceituação da Ética é possível identificar dois grandes campos de concepções fundamentais: Na primeira concepção, "o bem seria para onde se dirigiria o homem", e na segunda concepção, "o bem seria uma realidade, embora não inscrita na natureza, humana e alcançável" (Abbagnano, 1998, página 380 e 381).

A Ética, um ramo da Filosofia que busca os princípios ou fundamentos da natureza das ações humanas, pode também referir-se a princípios que fundamentam o pensar humano, sem formular ações ou regras de conduta, precisas e fechadas.

Ética, também chamada de Filosofia da Moral, é caracterizada por ser um pensar reflexivo dos princípios ou fundamentos que determinam os valores e as normas que governam a conduta humana.

Nesta perspectiva, a Ética enquanto Filosofia da Moral mantém ampliadas ligações de natureza prática com outras áreas do conhecimento humano, dentre as quais, a biologia, a antropologia, a economia, a sociologia, a teologia, a história e a política. São áreas do conhecimento caracterizadas por serem disciplinas regidas pela lógica cartesiana da sistematização, com ordenamento racional e perda do caráter sagrado, portanto ciências descritivas ou experimentais.

A Ética, enquanto Filosofia da Moral, ao contrário, busca a determinação dos fundamentos ou princípios que justificam a natureza de teorias normativas e estando determinados os fundamentos ou princípios, aplica-os, se necessário, e quando for o caso, aos dilemas morais.

Algumas áreas do conhecimento que eram objeto de estudo da filosofia, em especial da Ética, após a revolução industrial e a consequente profissionalização e especialização do conhecimento, estabeleceram-se como disciplinas independentes e científicas.

Assim, pôde a Ética ser definida como a área da filosofia que estuda as normas morais nas sociedades humanas e que pretende explicar e justificar os costumes de uma determinada sociedade, bem como, solucionar dilemas a ela inseridos.

A Moral é um conjunto de normas e regras estabelecidas por cada sociedade e aplicadas ao cotidiano de cada pessoa. A moral ocorre em dois planos: o normativo e o factual. De um lado, nela encontramos normas e regras que tendem a regulamentar a conduta dos homens e, de outro lado, um conjunto de atos humanos regulamentados por eles; cumprindo assim a sua exigência de realização (Vásquez, 1998, página 51-64). A Moral, com suas normas e regras que orientam e julgam as ações do indivíduo sobre o que é certo e errado, bom e mau, moral e imoral. Um pensar sobre a conduta.

A Ética investiga justamente o significado e propósito desses adjetivos, tanto em relação à conduta humana, como em seu sentido fundamental e supremo. Um pensar a partir de princípios ou fundamentos. Um infindável pensar, refletir e construir.

Noutra perspectiva, existe a Moral como primazia exclusiva, defendida por um sistema filosófico, o Moralismo, que fundamentou ideologias de intolerância, de preconceito e de puritanismo.

Para alguns, a palavra Moral foi desqualificada por esta associação a Moralismo e, deste modo, justificaram a preferência em associar à palavra Ética, as regras e os valores por eles consagrados. No campo das ideologias, não se pode deixar de apontar a diferença que se estabeleceu entre a lógica dos que associaram a palavra Ética às regras e valores por eles consagrados e a lógica dos moralistas, onde a Moral aparece como primazia exclusiva. Passou a referir-se a julgamentos éticos, ou princípios éticos, quando seria mais pertinente falar de juízos morais ou princípios morais.

Assim, existem pessoas que possuem um valor e por um processo psicológico que legitimam as normas ou regras decorrentes e pautam sua conduta por elas, sem controle externo, só porque estão emocionalmente convictas de que, essa regra representa um bem moral. Outras pessoas por costume e por hábito validam certas condutas.

Há aquelas que consideram determinadas condutas como boas, e assim, devem ser praticadas. Aqui o juízo de valor como matriz para a legitimação das normas. São exemplos de conduta Moral, de Moralidades.

Existem pessoas em que os processos inconscientes seriam os determinantes da conduta moral, que são oriundos da sua individualidade pessoal e social, responsável pela forma habitual e constante de agir do caráter e da personalidade. Este é um exemplo de Ética, enquanto Filosofia da Moral.

A partir do final do século XIX, da era dos sofistas e início do século XX, observa-se na Ética ocidental três perguntas constantes: seriam os juízos éticos reflexos dos desejos dos que os criam ou verdades inseridas neste mundo; seria a ação boa, fruto da racionalidade construída, introjetada ou inculcada ou simplesmente ação vinculada ao interesse próprio; e ainda, qual seria a natureza do certo, do errado e do bem.

Desde o início do século XX estes temas desenvolveram-se nas mais variadas formas, com ênfase na aplicação da Ética para problemas práticos e descritos como Ética normativa, Ética aplicada e Meta-ética. Esta última como estudo que, diferente de prender-se à análise de teorias éticas ou julgamentos morais, dedica-se à busca da natureza dos juízos morais, se objetivos ou subjetivos.

Por óbvio, pode-se estar inserindo aqui a Ética Maçônica como estudo contemporâneo e ajustado ao paradigma deste milênio, quando ela busca ajudar os irmãos a legitimar intimamente valores, pela introjeção de princípios ou fundamentos que os farão conduzir-se coerentemente por normas e regras, consagradas como boas e virtuosas. Abordam-se os princípios ou fundamentos filosóficos que pretendem ser valores intimamente legitimados pelos maçons e passem a ser sistema de regras e normas que os norteiem e os qualifiquem nas relações entre irmãos e sociedade.

Considera-se que o maçom aperfeiçoa-se gradativamente, lentamente acordando dentro de si mesmo, pela autoeducação, autoconhecimento e relações fraternas, esta ética maçonicamente orientada, onde algumas etapas o levam a evoluir como pessoa humana pertencente a um único corpo vivo e interdependente ao qual se denomina humanidade.

E esta humanidade é o que o maçom desenvolve em si em sua caminhada, em sua busca por religação ao divino e para cumprir a especificação de projeto do Grande Arquiteto do Universo.

A ética maçônica tem reflexos imediatos na vida do cidadão formado nas colunas da Maçonaria.

O maçom que muda a si mesmo influencia o Universo inteiro e não apenas a circunvizinhança. Isto é perceptível em sua vida quando ao mudar paradigmas torna-se dono de seu próprio futuro.

Charles Evaldo Boller e Carlos Alberto Peixoto Baptista

Rito: Rito Escocês Antigo e Aceito
Grau do Texto: Aprendiz Maçom.


O TEMPLO MAÇÔNICO E SEUS SÍMBOLOS



Daremos início a estas reflexões sobre o Simbolismo do Templo, revisando previamente alguns conceitos, muitas vezes mal interpretados pelos que pertence a esta Augusta Ordem. Refiro-me aos termos LOJA e TEMPLO.

Ambos os termos analisaremos brevemente, desde o ponto de vista EXOTÉRICO e desde o ponto de vista ESOTÉRICO.

LOJA MAÇÔNICA

A – EXOTÉRICO
É o conjunto de pessoas que integram a família maçônica. Tal como a Igreja, que é simplesmente a congregação de seus fiéis, a Loja não é um LUGAR FÍSICO, senão que a associação ou somatório daquelas pessoas que realizam o trabalho maçônico, quer dizer, a intenção de continuar o caminho que empreenderam no momento da sua Iniciação Maçônica.

Única maneira – portanto – de alcançar a verdadeira iniciação, pois é inegável que a cerimônia dedicada a este propósito, está constituída somente por uma série de símbolos que se oferecem ao Recipiendário, para que ele, com o trabalho tenaz e ininterrupto, alcance a Iniciação Real.

B - ESOTÉRICO      
A Loja é a congregação do exército de virtudes que se unem e se dispõem a luta contra os instintos, os vícios e as paixões que a escravizam e lhe roubaram o seu reino.

TEMPLO MAÇÔNICO

A – EXOTÉRICO
É o edifício, a estrutura física, na qual se reúnem os maçons para avançar na senda até a perfeição.

B – ESOTÉRICO
Desde este ponto de vista, podemos assinalar que o Templo Maçônico é o Corpo Humano, onde mora o SER, a Essência Infinita, o Espírito de Deus. É chamado de Templo porque não é outra coisa que o santuário que utiliza a Divindade (o homem é a chispa divina com os mesmos atributos do Criador) para manifestar-se neste universo físico.

DIFERENÇAS ENTRE LOJA E TEMPLO

Do ponto de vista EXOTÉRICO existe uma diferença palpável, pois uma coisa é o conjunto de irmãos que se congregam para crescer em sabedoria e virtude, e outra, muito diferente, é o lugar onde se reúnem.

Todavia, quando observamos as coisas sob o ponto de vista que está mais além das aparências (ESOTÉRICO), damo-nos conta que não existem diferenças, pois assim como é em cima, é embaixo, ou seja, que tanto as pessoas que se reúnem como as paredes do Templo, no qual trabalham, não são outra coisa que ENERGIA CONSCIENTE E INTELIGENTE. Todo este universo é uma, e exclusivamente esta, Energia que mantém cada coisa exatamente no lugar em que deve estar.

Cada Ser Humano cria seu próprio universo e o segue criando até o dia em que decide partir, para logo voltar a criar outro universo novo, na medida das suas necessidades espirituais.

O QUE CONTÉM UMA LOJA E O QUE CONTÉM O TEMPLO MAÇÔNICO?

A Loja sendo a congregação dos irmãos, que não são outra coisa que pequenos universos, contêm todas as virtudes e todas as boas intenções de seus membros em sua luta para alcançar a Maestria sobre si mesmos.

Ela é, então, o somatório das Luzes de todos e de cada um de seus membros. Também na Loja se encontram simbolizadas todas as manifestações do universo físico que, observadas desde o ponto de vista esotérico, só refletem a imensidão espiritual que se encontra no interior do Ser Humano.

O Templo, por sua parte, está pleno de Símbolos e Alegorias que servem para recordar aos Irmãos sua origem celestial (por dar-lhe um nome) e que dentro de seu próprio corpo há tantas estrelas, ou mais, das que se encontram espargidas no espaço infinito.

A estes Símbolos dedicaremos alguns minutos da nossa exposição, não sem antes deixar bem assentado – bem claro – que a palavra Templo implica o conceito de SAGRADO. Um Templo pode se situar fora de nós mesmos ou pode se encontrar em nossa interioridade, ficando sempre invariável essa condição de SAGRADO.

O TEMPLO MAÇÔNICO, SEUS ESPAÇOS FÍSICOS

O Templo Maçônico (Exotérico), em geral está constituído por uma série de espaços entre os quais podemos destacar os seguintes:

1 – O QUARTO (CÃMARA) DAS REFLEXÕES

Representa o planeta Terra no qual nascemos, morremos e encontramos o repouso eterno. O Q.: Ir.: Pedro Barboza de la Torre, Grande Inspetor Geral da Ordem, em uma de suas importantes obras, manifesta que este simboliza, em primeiro lugar, a Matéria que é a base dos seres e que se oferece aos sentidos em diferentes estados. 

Representa, também, o centro da terra e a matriz da mãe, onde o novo ser se forma e se prepara para nascer.

Ali morre o homem para os vícios e as paixões e nasce para praticar a virtude, a sabedoria e o bem.

 2 – SALÃO DE BANQUETES

Local destinado à celebração de reuniões do tipo social.

3 – CÂMARA DE MESTRE ou CÂMARA DO MEIO

Lugar onde os Mestres Maçons realizam seus trabalhos.

4 – SALA DE PASSOS PERDIDOS

Lugar onde se concentram os Irmãos antes de entrar no Templo propriamente dito ou lugar de trabalho (Câmara). É o lugar onde devem ser recebidos os Visitantes antes de serem anunciados. É ali e não dentro do Templo onde se assina o Livro de Presença e a Prancha Convocatória ou de Citação. Também é ali onde os Irmãos devem colocar os Aventais, Colares e demais condecorações.

5 – ÁTRIO
É a linha, ou espaço físico, que separa o mundo profano do sagrado, pois é neste lugar que os maçons se recolhem e se concentram, antes de entrar no Templo. É, segundo Juan Carlos Daza, no Dicionário da Franco-Maçonaria, o “umbral do Templo e simboliza o espaço de trânsito e de união, que separa o exterior do interior, e é onde se espera, em recolhimento, para ser acolhido ou introduzido”.

Para Lorenzo Frau Abrines - para citar outro autor -, é o espaço ou sala que se acha diante da entrada ou porta do Templo onde se celebram os trabalhos. Alguns autores o chamam Parvis, que segundo eles, é a peça que precede ao Templo.

6 – TEMPLO OU CÂMARA – Seus Símbolos
O Templo é um lugar fechado onde se realizam os trabalhos maçônicos no grau de Aprendiz, e que tem a forma de um paralelogramo ou quadrado oblongo, estendido do Oriente ao Ocidente, quer dizer, em direção à Luz; sua largura é de Norte ao Sul, sua profundidade é da Superfície ao Centro da Terra e sua altura do Zênite ao Nadir, porque a Maçonaria é, simplesmente, Universal e o Mundo é uma Loja.

O Templo não tem janelas, por quanto não deve receber luz de fora, senão que, exclusivamente, de dentro, e só uma porta de entrada localizada no ocidente, pois o homem entre e sai deste mundo por uma só porta.

O Templo Maçônico, nos diz Juan Carlos Daza, “é a matriz, é o Athanor hermético, onde renasce a vida espiritual mediante a correta utilização dos símbolos e das ciências, os quais operam como portadores de uma mensagem que nos regenera, quanto mais interiorizamos sua significação espiritual e operam com utensílios ou ferramentas para edificar nosso templo interior, o qual vive dentro da dialética do movimento do mundo, de sua criação e de sua destruição”.

De sua parte, Orlando Solano Barcenas, faz uma interessante descrição em sua obra “A Loja Universal”: “O Templo maçônico não é a simples delimitação arquitetônica de um espaço qualquer, senão a consagração simbólica de um espaço considerado sagrado”.

“Por sagrado não deve entender-se religioso. A respeitabilidade do templo ou sua sacralidade fazem com que este lugar participe de uma série de valores culturais, éticos e simbólicos que o convertem no reflexo de uma cosmovisão própria do pensamento maçônico...”.

O Templo – antes que procedamos a entrar nele – “como lugar respeitável permanece separado do nível da experiência corrente, banal ou cotidiana. Em outros termos, permanece separado do profano e das indiscrições do mundo exterior”. 

Dentro do Templo, logicamente, não se deve fumar, comer nem beber e sempre há que se penetrar nele com as insígnias do grau devidamente colocadas, em silêncio e respeito, evitando todo o tipo de conversação, por quanto é um lugar destino ao trabalho interior.

A respeito, o Dr. Serge Raynaud de la Ferriere, no Livro Negro da Franco-Maçonaria, destaca que “freqüentemente o Templo não corresponde senão que a um simples nome, em vez de possuir todas as suas qualidades; com efeito o Santuário deve estar glorificado da presença do G.'. A.'. D.´. U.'. e, por tanto, não é só o ritual parafraseado o necessário, senão que um ambiente muito especial”.

Como assinalamos antes, o Templo Maçônico só tem um lugar para ingressar, de maneira que vamos agora penetrar nele e, para isso, falemos em primeiro lugar da Porta, que como seu nome o indica é o lugar de entrada ou de saída de todo o aposento fechado ou, também, o elemento arquitetônico que facilita a passagem entre duas áreas separadas por algum tipo de fecho. Do ponto de vista maçônico é a abertura que comunica dois mundos, é dizer o mundo profano e o mundo sagrado.

Juan Carlos Daza: “A porta da Loja é, por si mesma, um Templo; suas duas colunas e a arquitrave representam o ternário e o elemento fundamental de toda a construção”. 

Este mesmo autor manifesta que “na cerimônia de iniciação, o recipiendário trespassa a primeira porta, ao ser despojado dos metais... Esta porta é muito baixa, não como sinal de humildade, senão que para assinalar a dificuldade da passagem a uma nova vida, como a criança que vem ao mundo e começa a aprender a andar avançando primeiro de gatinhas”.

Jorge Adoum, em “As Chaves do Reino Interno”: “A porta do Templo é a primeira estância da iniciação interna; para aprender os mistérios do espírito, deve-se entrar no Templo interior onde estão ocultos tesouros”.

Orlando Solano Barcenas, em “A Loja Universal”: “Sua forma, sua situação e sua orientação, traduzem uma série de escolhas de valores espirituais e culturais que, em seu simbolismo, servem para diferenciar o espaço sagrado do Templo Maçônico”. “Fixa a direita e a esquerda do Templo, direções simbólicas que traduzem a base do triângulo que fixa a hierarquia da Oficina. Representa a aurora, porque em seu umbral, participa também da sacralidade ao separar e definir o interno território sagrado, vedado aos intrusos, aos profanos”.

No Templo de Salomão, segundo está estabelecido no Primeiro Livro de Reis, tal como na maioria dos templos ou antigos santuários, cujas características eram similares, havia um Pórtico ou Ulam de 20 côvados de largura, por 10 de comprimento e 30 de altura, além do Lugar Santo ou Heijal ou, ainda, Hekal e o Sancto Sanctorum ou Debir.

Diante do Pórtico havia duas grandes colunas de bronze, ou revestidas dele, que constituíam a Porta do Templo, que não tinham razão estrutural alguma e cuja intenção era estritamente simbólica.

Da análise destes conceitos e os de muitos outros autores, como Edgar Perramon, no “Breve Manual Maçônico”, que expressa que “A entrada estavam duas colunas, B (a força) e J (a beleza) sobre as quais se encontravam o Universo e uma Romã ligeiramente aberta como símbolo da maturidade”. Raymond Capt, no “Templo do Rei Salomão”; em “Meus Três Passos”, de Pedro Camacho Roncal; e também Jorge Adoum, em “O Aprendiz e seus Mistérios”, referem que “entre ambas as colunas se achava a porta do Templo”.

Alec Melor, em sua obra “A Encruzilhada da Maçonaria”, Tomo II, diz que “A porta da Loja se achava no Ocidente, quer dizer, frente ao Oriente, entre duas Colunas, com capitéis ornados de lírios e coroados de maças e romãs simbolizando a família”; poderíamos então considerar que a Porta do Templo Maçônico está constituída pelas duas Colunas (B e J) e que o espaço entre a porta física e estas duas colunas poderia ser o Átrio.

Todavia, outra consideração nos poderia levar a pensar que as duas colunas sejam colocadas uma a cada lado da porta.

A/D


SER OU ESTAR MAÇOM



Atualmente podemos afirmar que "Ser ou Estar alguma coisa" está se tornando uma expressão bastante difundida, que é utilizada para identificar se uma pessoa assumiu ou não seu posicionamento correto com respeito a qualquer organização da qual participa, como por exemplo:

 - Quando se desempenha um cargo público ou legislativo, tal qual o de "Estar Ministro", entre outros exemplos, sendo inclusive utilizado com personagens em programas humorísticos. Absorvendo este conceito e aplicando-o no seio de nossa Fraternidade percebemos que todos nós

"Estamos Maçons" ao procedermos nossa Iniciação. Estamos Maçons ao frequentarmos a Loja e pagarmos as suas mensalidades e taxas. Estamos Maçons quando participamos de uma atividade organizada pela loja, uma atividade filantrópica, uma palestra, uma visita a outra Loja. Ou até mesmo Estamos Maçons quando meditamos sobre o nosso papel e partimos em busca da meditação interior em busca da verdade.

Mas o que é Ser Maçom?

O verbo SER não poderia ser considerado sinônimo do verbo ESTAR.

A caracterização mais expressiva é de que estar é um verbo que indica certo estado, portanto, há como que embutido em seu conteúdo certa passividade, enquanto que o verbo ser é ativo, representa ativação.

Ser Maçom é um estado de espírito que deve caracterizar o membro presente a toda situação em que pode ajudar e cooperar para que o mundo torne-se de alguma forma melhor.

Ser Maçom é compreender que por mais poderosas que sejam as forças externas elas devem ser dominadas pela energia que tem sede em sua própria personalidade.

Ser Maçom é ter consciência que sua presença discreta pode dar apoio a novos projetos úteis à comunidade e constituir-se num valoroso pilar de sustentação de valores mais nobres do indivíduo.

Ser Maçom é ser o eterno estudante que busca o ensinamento diário, tirando de cada situação uma lição, e aplica com êxito os princípios estudados.

Desenvolve em toda oportunidade de sua intuição, sua força de vontade, sua capacidade de ouvir e entender os outros. Temos que considerar que o Ser Maçom deve, como livre pensador, questionar o porquê de determinados acontecimentos entendendo e vivenciando nos nosso aprendizado que palmilhamos lentamente, com passos firmes para não tropeçar nos erros e vícios do passado, mesmo que em momentos saiamos da trajetória para poder compreender o mundo com uma visão holística de suas nuances.    
                         
O Maçom que se limita a ler ou estudar as instruções dos graus ou a literatura disponível e não procura aplicar em sua vida diária os conceitos que lhe são transmitidos, na busca do desbaste da Pedra Bruta, e em erigir o Templo Interno, perde excelentes oportunidades de ampliar seus conhecimentos e de verificar como o saber do aprendizado da Arte Real pode ser útil para o seu bem-estar na busca de seu retorno ao Cósmico.

O Ser Maçom é aquele estado em que sem abandonar os hábitos de disciplina racional, a mente busca uma abrangência do universo, o conhecimento intrínseco dos fenômenos que estão ocorrendo, procurando desenvolver a sensibilidade e a compreensão das razões de estudo.

O Maçom que desenvolveu sua mente para estar atenta e acompanhar a evolução dos fatos sabe como conhecer as sutilezas que envolvem suas origens, é como um oleiro que dá formas sutis ao barro bruto, enquanto que o Maçom modela sua própria consciência num confronto com sua própria personalidade.

Vivemos juntos e cruzamos com diferentes seres humanos que pensam e agem de maneira diversa da nossa. Isto nos propicia excelentes oportunidades de nos adaptarmos a estas personalidades e, sobretudo, de aprimorarmos as formas de inter-relacionamento.

A sabedoria do bem viver é despertada quando nos conscientizamos dessas diferenças e procuramos compreender o indivíduo através de suas particularidades.

Ser Maçom é despertar este sentido de compreensão do indivíduo e estar preparado para assisti-lo nos momentos de dificuldades. O exemplo de uma atitude mental moderada, sincera e cooperativa caracteriza muito o Ser Maçom.

E todos notam que sob muitos aspectos, o Ser Maçom diferencia-se como indivíduo entre todos os outros. No aprendizado inicial aprendemos que além dos SS.'. TT.'. e PP.'. o Maçom deve ser reconhecido pelos atos e posturas dentro da sociedade e no meio onde vive, traduzindo de maneira diuturna os nosso aprendizado e a filosofia dos postulados da Arte Real. Sentimos que temos que desempenhar um papel mais complexo na sociedade e dar uma contribuição positiva para que ela se torne superior.
                                                                                  
Ser Maçom implica em algumas renúncias, mas a compensação que advém deste estado de espírito especial é muito agradável. Sentimo-nos como se fôssemos os autores da novela e não apenas os personagens passivos, criados pelos mesmos.

Temos uma participação presente e atuante, embora que, aparentemente o Maçom apresente-se um tanto reservado. Já se disse que nos colocamos muito mais em evidência, quando nos mantemos como observadores e damos a colaboração somente quando é solicitada pelos outros, do que aqueles que procuram apresentar-se como os donos da festa.

Considerem, sobretudo, que encontramos muitas pessoas evoluídas e que podem ser consideradas possuídas de elevado espírito Maçom. Têm uma expressiva vivência das coisas do mundo e utilizam grande sabedoria em suas decisões, mesmo se nunca se tornaram Maçons.

Nós estamos Maçom ao entrarmos na Ordem e Somos Maçom quando o espírito dela entrar em nós. A diferença é muito grande, mas facilmente perceptível. Irmãos unam-nos na trilha que leva ao Templo ideal e tomemos o cuidado para não Estarmos Maçons, para não trilharmos a Maçonaria simplesmente cumprindo Rituais, envergando a mera condição de um "Profano de Avental".

Desejo que todos avaliem como é bom SER MAÇOM!


BIBLIOGRAFIA

Texto extraído do site www.polibusca.com.br

O QUE É O SEGREDO MAÇÔNICO?


O "segredo maçônico" é daquelas coisas a que a curiosidade da sociedade, certa comunicação social, e alguns setores mais "aguerridos" não resistem.

A maçonaria é coisa de que só recentemente se fala às claras e na praça pública: antes só merecia comentários em surdina, meias palavras e olhares de desagrado, invariavelmente acompanhados de desinformação, descontextualizados e eivados de preconceito.

Uma boa parte da responsabilidade é dos próprios maçons. Perseguidos anos a fio, mantiveram-se a partir de certo ponto de tal modo "subterrâneos" e discretos que não se preocupavam, sequer, com o que deles diziam - quanto mais preocuparem-se com a refutação pública das inverdades, e com a divulgação de informação correta sobre a maçonaria.

Os tempos têm mudado, os extremismos do passado têm-se refreado, e a maçonaria começa a poder sair debaixo da pedra onde se escondeu - e os maçons começam a querer desfazer os equívocos resultantes de décadas de silêncio. 

No entanto, ao fazê-lo, deparam-se com uma primeira linha de ideias feitas, de argumentos falaciosos, de cegueiras voluntárias, em referências constantes às mesmas fontes já mil vezes desmascaradas, na insistência em questões já inúmeras vezes respondidas, e na recusa em mover-se um milímetro para além dos pontos de vista anteriormente adquiridos.

 O que, de início, parece ser um desafio interessante, começa a tornar-se numa desmoralizante e surda guerra de teimosias e de cansaços. É que, depois de se responder à mesma pergunta trinta vezes seguidas, de cada vez tentando encontrar uma resposta mais certeira, mais facilmente inteligível, mais passível de irradiar a dúvida, e perante a incessante repetição da mesma pergunta, vezes sem conta, acabam-se as ideias, exaure-se a imaginação, e esgota-se a paciência.

 No que me concerne, tenho-me esforçado por encarar cada pergunta como uma vontade honesta de chegar à verdade. Mesmo aquelas que, colocadas de má fé, não pretendam senão passar a proverbial rasteira merecem-me uma resposta tão cândida quanto o consigo: afinal, as respostas ficam aqui, para usufruto e benefício de quantos as quiserem ler, e pode ser que aproveitem a alguém...

 Quem está de fora não pode falar de maçonaria sem falar de segredo. De fato, arrisco a dizer que o segredo é aquilo de que mais se fala "de fora" quando se fala de maçonaria. E também arrisco dizer que não se fala mais de segredo "de dentro" porque é algo já tão interiorizado que (já) não merece constante reparo. Deixem que repita uma vez mais: os "segredos" da maçonaria não passam do conteúdo dos rituais, dos meios de reconhecimento dos vários graus, da identidade dos maçons e do que se passa nas sessões.

Os dois primeiros segredos são simbólicos e rituais. O conteúdo dos rituais não tem nada de especial, e estou certo de que quem os ler esperando encontrar alguma verdade miraculosa ficará muito desapontado: simplesmente determinam quem diz o quê, quando, e em que circunstâncias, um pouco com uma peça de teatro.

Também os sinais de reconhecimento são meramente rituais, e usados quase exclusivamente em loja ou à entrada de um templo maçônico. Os maçons não andam aí pela rua a fazer "sinalizas" uns aos outros...

Os outros dois segredos têm que ver com a reserva da privacidade das pessoas. A identidade dos maçons só pode ser revelada pelos próprios, uma vez que muita gente ainda vê a maçonaria com maus olhos, e a revelação da condição de maçom de alguém pode, por essa mesma razão, causar-lhe dissabores profissionais, sociais ou religiosos.

Por outro lado, ao guardar-se segredo do que cada um diz em loja confere-se aos participantes a liberdade de se exprimirem sem reservas, com a certeza de que as posições que revelarem as ideias que defenderem as atitudes que tomarem, ficarão ali.

Só errando se aprende, e a maçonaria é uma escola de aprendizagem. Cada um é convidado a dar o melhor de si, sem o medo de errar e sem temer a acusação dos demais. Longe disso, aprende-se que o mais implacável juiz de um homem deve ser ele mesmo, mas que para isso é preciso que os demais se refreiem e lhe deem espaço e tempo para que isso suceda sempre num ambiente de confiança e de entre ajuda.

Não esqueçamos que a maçonaria especulativa nasceu há mais de três séculos em Inglaterra, e que era uma escola de gentlemanship, vindo por isso bem embebida da cultura e valores desse país e dessa época.

Umgentleman era na altura (e ainda hoje...) alguém de quem se espera certa contenção, certa reserva no trato, uma dose de circunspeção que evite a precipitação nas conclusões, incessantes mudanças de opinião ou, até, a exteriorização de mais asneiras do que as circunstâncias o permitam, podendo fazê-lo cair em descrédito...

Diz-se, às vezes a brincar, que o grande segredo é que não há segredo nenhum; é quase isso. Para além do enunciado, não há mais "segredos" que possam servir seja para o que seja. Não há ingredientes mágicos, fórmulas secretas ou passagens ocultas; apenas o salientar de uma característica importante num cidadão maduro. 

É que aprender a calar-se é algo que demora tempo, especialmente numa sociedade em que tudo é cada vez mais transparente.

É, precisamente, para a aprendizagem do refrear-se, do não dizer tudo o que nos passa pela cabeça, do guardar o que se pretende dizer para o momento que seja mais apropriado, que serve o "segredo".

Este não é mais do que mera ferramenta de trabalho, um exercício de vontade, no sentido de levar os maçons a aprender a guardar para si as - eventualmente injustas, possivelmente erradas, certamente precipitadas - primeiras impressões acerca do que quer que seja.


A/D

O RITO DE INICIAÇÃO: UMA ABORDAGEM ANTROPOLÓGICA


O presente trabalho busca estabelecer alguns conceitos antropológicos para se analisar, em seguida, o rito de iniciação maçônico no R.’.E.’.A.’.A.’. como uma busca de apaziguamento da ânsia do sagrado que a humanidade vem procurando nos últimos tempos.

A Função Social do Rito
Um dos componentes fundamentais dos grupos e das sociedades humanas é o processo ritual. Os ritos e as cerimônias permeiam todo o grupamento social, desde as sociedades primitivas até as modernas sociedades pós-industriais.

Os antropólogos contemporâneos afirmam que temos um comportamento ritual quando amamos e fuzilamos, quando nascemos e morremos, quando noivamos ou casamos, quando ordenamos e oramos.

Os rituais revelam os valores mais profundos do comportamento humano e o estudo dos ritos tornou-se a chave para compreender-se a constituição essencial das sociedades humanas.

Se o processo ritual é tão remoto quanto a própria criação do Homem, o estudo sistemático e científico dos ritos advém com a formação da antropologia no século XIX.

Estudam-se hoje os ritos como um fenômeno social que possui um espaço independente, isto é, como um objeto dotado de uma autonomia relativa em termos de outros domínios do mundo social, e não mais como um dado secundário, uma espécie de apêndice ou agente específico e nobre dos atos classificados como mágicos pelos estudiosos.

Essa autonomia relativa da antropologia foi conseguida a duras penas no processo de formação da própria antropologia. Os antropólogos ingleses, da época vitoriana, evolucionistas e etnocêntricos, estudavam os fenômenos mágicos e ritualísticos das sociedades primitivas como um meio, no fundo, de provar a superioridade biológica e cultural do europeu de então.

Para os estudiosos da época, o ritual não surgia como algo socialmente relevante, pois nem mesmo o fato social existia conceitualmente como algo socialmente independente, como viria a ser descoberto pela sociologia de Durkheim posteriormente.

Para os antropólogos vitorianos, por desconhecerem o fato social, reduzia-se o mesmo às suas componentes biológica, psicológica ou geográfica.

Para os reducionistas biológicos, os fenômenos sociais ou antropológicos eram explicados como resultantes de tensões e caracteres raciais. O social submergia no biológico do mesmo modo que o diferente, o outro, desaparecia na sua história natural.

Na outra vertente, a do reducionismo psicológico do século XIX, o social se liquefaz na vontade dos agentes individuais, vontade, depois projetada, por meio de um fiat obscuro para toda a sociedade. Segundo o antropólogo brasileiro Roberto da Matta, na apresentação do livro clássico de Van Gennep, Os Ritos de Passagem, “Tylor é um excelente exemplo desta posição (psicológica). Ele (Tylor) explica a origem da religião como uma especulação na crença da alma, especulação que nasce dos sonhos dos primitivos.

Sonhando com tudo e principalmente com os mortos, os homens primitivos descobrem diz Tylor a noção de alma, de imagem, de duplo e assim constroem o domínio do ‘outro mundo’, o domínio do sagrado e do sobrenatural. Descobrem também, segundo o mesmo estudioso, que pode haver uma relação entre os dois domínios e procuram então controlar um pelo outro.

Estaria agora fundada a estrutura mais elementar da religião: a crença em espírito e em almas e a condição necessária a esta crença, a divisão entre o mundo dos vivos e o dos mortos. Daí, como sabemos o nome ‘animismo’ para designar a religiosidade básica e enganada do primitivo. Nesta perspectiva psicológica, que engloba estudiosos de Tylor e Frazer, o interesse é discutir o religioso em suas formas mais primitivas, fazendo um corte evidente entre as religiões com tradição escrita (do Ocidente e, às vezes, das grandes civilizações) e a magia, forma de religiosidade vigente nos grupos tribais, selvagens e primitivos” (pg. 13).

A terceira variante explicativa era a do reducionismo geográfico ou ecológico. Reduzia-se, mais uma vez, o social à dinâmica dos climas, dos solos, das vegetações, do regime de chuvas e ventos. Presume-se que até mesmo o escritor brasileiro Euclides da Cunha, em “Os Sertões”, sofreu este reducionismo geográfico ao explicar o comportamento do sertanejo.

Todos esses três reducionismos biológico, psicológico e geográfico liquidam o social como um fenômeno específico de estudo. Contudo, a tomada do fato social como um fenômeno não explicável nem pela biologia, nem pela psicologia e muito menos pela geografia, nasce da tradição francesa de Comte e, sobretudo pela sociologia de Émile Durkheim.

Já não se trata aqui de subdividir o social para estudá-lo, fazendo dele um fenômeno individualizado e redutível a uma de suas partes, mas tomar o estudo da sociedade, partindo de sua totalidade.

O social adquire então a sua feição contemporânea: são fatos capazes de coagir e, sobretudo de não serem redutíveis a seus componentes geográficos, psicológicos, etc.

Não se negam estes aspectos biológico, psicológico e geográfico do fato social ou cultural, mas não é isso que os faz socialmente significativos. Pela sociologia de Durkheim, somente quando se tornam socialmente significativos é que são levados em consideração.

O modelo a ser apresentado para a análise do ritual de iniciação maçônico não será, contudo o de Durkheim, que escreveu sobre a magia e a religião, por ser o seu foco centrado na religião elementar, nas formas mais simples da vida religiosa, como também por apresentar uma polaridade rígida entre o sagrado e o profano.

O modelo escolhido será então o de Van Gennep, no seu famoso “Ritos de Passagem”. Esse autor não toma mais o rito como um apêndice do mundo mágico ou religioso, mas como algo em si mesmo.

Como um fenômeno dotado de certos mecanismos recorrentes (no tempo e no espaço) e também de certos conjuntos de significados, o principal deles sendo o de realizar uma espécie de costura entre posições e domínios sociais, pois a sociedade é concebida em Van Gennep como uma totalidade dividida internamente.

Se Durkheim percebe a sociedade composta de um sistema coercitivo de regras, sobretudo as regras penais e religiosas, com uma divisão interna entre o sagrado e o profano, Van Gennep concebe o sistema social como estando departamentalizado, como uma casa, com os rituais sempre ajudando e demarcando os quartos e as salas, os corredores e as varandas, por onde circulam as pessoas e os grupos na sua trajetória social.

Concebendo a sociedade como internamente dividida, Van Gennep introduz um dinamismo no mundo social que nem vitorianos nem durkheimianos foram capazes de reconhecer. Se a divisão clássica entre o sagrado e o profano é vista como cerne e raiz do mundo social, Durkheim trabalha numa perspectiva dualista do mundo, com um jogo do sagrado ao profano, do mecânico ao orgânico, como domínios fixos e mutuamente exclusivos. Em suma, Durkheim é um evolucionista de sequências duais e também um sociólogo dos pontos polares, jamais das margens e das posições mais confusas, quando a totalidade social não se encontra nem no pólo do sagrado nem do profano.

Em Van Gennep, o sagrado e o profano são totalmente relativos, pois sempre haverá um lado mais sagrado dentro da própria esfera tomada como sagrada, o mesmo sendo válido para o profano. O sentido não estará equacionado a uma essência do sagrado (ou profano), mas na sua posição relativa dentro de um contexto de relações.

Van Gennep no seu “Ritos de Passagem” estuda diversos ritos, tais como: da porta e da soleira, da hospitalidade, da adoção, da gravidez e parto, do nascimento, da infância, da puberdade, da iniciação (que nos interessará mais de perto), da ordenação, do noivado, do casamento, dos funerais, das estações, etc.

Ele separa antologicamente os ritos em três grandes subdivisões: ritos de separação, ritos de margem e ritos de agregação. Segundo Van Gennep (1978, pg.31) “essas três categorias secundárias não são igualmente desenvolvidas em uma mesma população nem em um mesmo conjunto cerimonial. 

Os ritos de separação são mais desenvolvidos nas cerimônias dos funerais, os ritos de agregação nas do casamento. Quanto aos ritos de margem, podem constituir uma seção importante, na gravidez, no noivado, na iniciação, ou se reduziriam ao mínimo na adoção, no segundo parto, no novo casamento, na passagem da segunda para a terceira classe de idade etc. 

Se, por conseguinte, o esquema completo dos ritos de passagem admite em teoria ritos preliminares (separação), liminares (margem), e pós liminares (agregação), na prática estamos longe de encontrar a equivalência dos três grupos, quer no que diz respeito à importância deles quer no grau de elaboração que apresentam.

Além disso, em certos casos, o esquema se desdobra, o que acontece quando a margem é bastante desenvolvida para constituir uma etapa autônoma. Assim é que o noivado constitui realmente um período de margem entre a adolescência e o casamento.

Mas, a passagem da adolescência ao noivado comporta uma série especial de ritos de separação, de margem e de agregação à margem. A passagem do noivado ao casamento supõe uma série de ritos de separação da margem, de margem e de agregação ao casamento.

Esta mistura é também verificada no conjunto constituído pelos ritos de gravidez, do parto e do nascimento. “Embora procure agrupar todos esses ritos com maior clareza possível, não escondo que, tratando-se de atividades, não se poderia chegar nestas matérias a uma classificação tão rígida quanto a dos botânicos, por exemplo”.

Antes de terminar esta parte teórica convém tecer algumas considerações sobre o sagrado e o profano. Segundo ainda Van Gennep (pg.25) “toda sociedade contem várias sociedades especiais, que são tanto mais autônomas e possuem contornos tanto mais definidos quanto menor o grau de civilização em que se encontra a sociedade geral.

Em nossas sociedades modernas só há separação um pouco nítida entre a sociedade leiga e a sociedade religiosa, entre o profano e o sagrado... Entre o mundo profano e o sagrado há incompatibilidade, a tal ponto que a passagem de um ao outro não pode ser feita sem um estágio intermediário...

À medida que descemos na série das civilizações, sendo esta palavra tomada no sentido mais amplo, constatamos a maior predominância do mundo sagrado sobre o mundo profano, o qual nas sociedades menos evoluídas que conhecemos, engloba praticamente tudo. Nascer, parir, caçar etc. são então atos que se prendem ao sagrado pela maioria de seus aspectos...

Se em nossas sociedades a solidariedade sexual é reduzida ao mínimo teórico, entre os semi-civilizados desempenha considerável papel em consequência da separação dos sexos nas questões econômicas, políticas, e sobretudo mágico-religiosas... A vida individual, qualquer que seja o tipo de sociedade, consiste em passar sucessivamente de uma idade a outra e de uma ocupação a outra.

Nos lugares em que as idades são separadas, e também as ocupações, esta passagem é acompanhada por atos especiais que, por exemplo, constituem, para os nossos ofícios a aprendizagem, e que entre os semi-civilizados consistem em cerimônias, por que entre eles nenhum ato é absolutamente independente do sagrado.

“Toda alteração na situação de um indivíduo implica ai ações e reações entre o profano e o sagrado, ações e reações que devem ser regulamentadas e vigiadas, afim de a sociedade geral não sofrer nenhum constrangimento ou dano”.

Mircea Eliade (1958, pg.9), por sua vez, afirma que “a originalidade do homem moderno, sua novidade com respeito às sociedades tradicionais, está precisamente na vontade de considerar-se como um ser unicamente histórico, no desejo de viver em um Cosmos radicalmente dessacralizado...

Em certo sentido, podemos dizer que, para o homem das sociedades arcaicas, a História está fechada, esgotadas em uns quantos acontecimentos grandiosos do começo. Ao revelar aos polinésios, in illo tempore, as modalidades da pesca em alto mar, o herói mítico esgotou de uma só vez as possíveis formas desta atividade; desde então, cada vez que vão pescar, os polinésios repetem o gesto exemplar do herói mítico: imitam um modelo transumano”.

O homem moderno perdeu o contato com o sagrado em muitas ações diárias. Frequentemente, viajamos dentro do país e ao exterior como fatos absolutamente corriqueiros. Nas sociedades arcaicas, as viagens eram raras, e antes de viajar realizavam-se cerimônias de purificação (rito de separação) para que o viandante não se poluísse ao entrar em contato com o estrangeiro. Ao chegar ao destino, o viajor poderia ou não ser recepcionado com um banquete (rito de agregação) que significava o seu ingresso em outra dependência do sagrado.

Contudo, por mais profanos que sejamos no mundo moderno, ainda mantemos os rituais, na maioria das vezes de forma inconsciente. Observe-se, por exemplo, as despedidas dos astronautas em Cabo Kennedy, momentos antes de partir em viagem de exploração. A cerimônia de despedida não deixa de ser um rito de separação, o tensionamento da viagem está inserido num rito de margem e quando a viagem é bem sucedida o retorno triunfal se insere num rito de agregação.

Visto esta parte mais conceitual, tenta-se agora aplicar tais conceitos vangennepianos ao rito de iniciação.

Análise do Rito de Iniciação

A ânsia do sagrado no mundo moderno também faz parte do ideário do maçom que busca sair do profano em direção ao sagrado.

Uma vez iniciado, o aprendiz evade-se um pouco de um mundo essencialmente profano e ingressa numa área um pouco mais sagrada, buscando alcançar o grau de companheiro, para finalmente atingir a plenitude maçônica. A senda em busca de apaziguar esta ânsia do sagrado prossegue nos altos graus e por que não dizer só termina com a morte.

Todo este período, que vai da iniciação até a morte terrena, pode ser chamado de um rito de margem ou de liminaridade, pois o processo de aprendizagem e maturação só encontrará o seu final, para efeito de análise, na morte terrena. Dentro desse período de margem de longo prazo, assistir-se-á aos mais diversos ritos de passagem de um grau para o outro.

Esta análise somente levará em conta o período de iniciação propriamente dito. A cerimônia de iniciação será, assim, o rito de passagem do mundo profano ao mundo sagrado.

Vejamos a introdução e a preparação do neófito. Denota-se já aqui um rito de separação, pois o mesmo não é separado dos metais, talvez simbolizando o despojamento de suas riquezas do mundo profano? Nem nu nem vestido simbolizando o desnudamento das vestes profanas, como num ritual de separação, pedindo humildemente o ingresso no sagrado.

A venda dos olhos simboliza a morte de um órgão vital estratégico que deverá renascer em um novo estágio de consciência compatível com um recinto mais sacralizado. A Câmara, o testamento, a prova da Terra seriam, mais uma vez, a morte do profano para um renascimento mais consciente em outra esfera do sagrado. Simbolicamente esta descida aos infernos ou pelo menos às profundezas da terra, como nos antigos mistérios greco orientais, seria rito de separação para uma longa viagem.

As outras três provas, já no interior do templo, podem ser vistas como ritos de aprofundamento de passagem, de purificação crescente, agora defronte os altares da Beleza, da Força e da Sabedoria. Podem ser analisadas como ritos de margem neste vestibular espiritual para uma esfera mais sagrada. Neste processo de alquimia mental e espiritual estaria se matando, homeopaticamente, o profano para o renascer, simbolicamente doloroso e ao mesmo tempo glorioso, do aprendiz tateante.

E aqui nos socorremos de Mircea Eliade (1958, pg. 12) quando diz que “a maior parte das provas iniciáticas implicam de maneira mais ou menos transparente, uma morte ritual se seguiria uma ressurreição ou novo nascimento. O momento central de toda iniciação vem representado pela cerimônia que simboliza a morte do neófito e sua volta ao mundo dos vivos. Mas o que volta à vida é um homem novo, assumindo um modo de ser distinto. A morte iniciática significa ao mesmo tempo o fim da infância, da ignorância e da condição profana”.

O batismo de sangue significaria o começo de um ritual de agregação, algo que na Igreja Católica se chama de Comunhão dos Santos, isto é, o iniciante depois de purificado pelas provas começaria a participar, a ser agregado simbolicamente à comunhão de todos os maçons.

O juramento teria algo do rito de margem, pois o iniciante, já agora menos poluído pelo profano e mais ciente do sagrado, teria então os pré-requisitos mínimos para um juramento mais consciente.

O nascimento o fiat lux pode ser analisado como o nascer biológico do novo ser, um rito de agregação ao mundo da Luz e da comunidade dos irmãos, que, em seguida, é batizado pelo ritual de iniciação propriamente dito. Nasce-se e imediatamente se é iniciado, sem perda de tempo, em suma, um rito sumário de agregação, a culminância do processo iniciático.

A passagem dos segredos de reconhecimento pode ser entendida como um reforço do ritual de agregação, um modo e um processo de comunicação rápido e instantâneo para melhor agregar a comunidade dos eleitos. Os aventais seriam, então, a nova vestimenta do sagrado para cobrir a nudez simbólica do ex-profano.

E por último, mas não menos importante, o banquete, que não fazendo parte direta da cerimônia do templo, insere-se num contexto de um ritual de reagregação. Aqui, já se está de volta ao mundo profano, mas como alguém que circulou pela esfera do sagrado e volta ao mundo profano aureolado pela sacralidade. É como uma espiral; deu-se um giro de 360º, mas num outro nível, outro patamar; está-se no mundo profano mas como um ser consagrado.

 Conclusão

A sociedade moderna assiste, cada vez mais, ao crescimento da onda avassaladora do profano em relação ao sagrado. Os núcleos de sacralidade são como pequenas ilhas no imenso oceano do profano. Tem razão Mircea Eliade (1958, pg. 9) quando afirma que “uma das características do mundo moderno é o desaparecimento da iniciação. De capital importância nas sociedades tradicionais, a iniciação é praticamente inexistente na sociedade ocidental de nossos dias.

É bem verdade que as diferentes confissões cristãs conservam, em diferentes graus, vestígios de um Mistério iniciático. O batismo é essencialmente um rito iniciático; o sacerdócio implica uma iniciação.

Não se deve esquecer que o cristianismo triunfou precisamente e chegou a ser uma religião universal senão por ter se liberado dos Mistérios Greco orientais, proclamando ser uma religião de salvação acessível a todos”.

Essa tendência secular de profanização da sociedade tem encontrado, contudo, nos últimos tempos, uma busca, por parte de alguns homens, de uma volta ao sagrado, ou um revolta contra o monopólio do profano, o que talvez tenha contribuído para que L. Kolakowski escrevesse o seu famoso ensaio em 1973: “A Revanche do Sagrado na Cultura Profana”.

Talvez se assista, no limiar do século XXI, a uma revivescência espiritual. As grandes religiões, que sempre foram matrizes de moralidade exotérica, estão em crise neste final do milênio, e estão sofrendo um processo crescente de profanização de sua cultura religiosa.

A luta frenética de alguns fundamentalismos, principalmente os de base muçulmana, para barrar o processo de modernização, inevitável no mundo atual, é prova cabal. 

Na faixa esotérica, considera-se a Maçonaria como uma das mais poderosas alavancas do sagrado no mundo laico, que avidamente necessita dos eternos valores maçônicos.

A resultante da crise deverá ser, não a negação das ciências e das liberdades humanas mais fundamentais, não uma volta ao passado preconceituoso, supersticioso e retrógrado, mas a busca de uma nova moralidade, que incorpore as raízes profundas da Verdadeira Tradição, compatibilizando-a com a Liberdade e a Ciência.

E, neste momento, cremos profundamente que a maçonaria terá um papel de escol a desempenhar.
Pelo Ven.’. Ir.'. William Almeida de Carvalho 33

Bibliografia
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